2006/10/26

Quanto menos conhecido, mais as pessoas notam
As trajectórias concorrentes de vinhos e pessoas

Desde que organizei a "prova dos cultos" no Eleven que uma ideia se me vem sedimentando dentro e que não tem, curiosamente, nada de novo: Uma peça de vinhos com as opiniões dos melhores críticos da especialidade não tem nem um décimo da notoriedade de uma peça de vinhos com testemunhos de famosos.

Então por que não se faz mais "disso"?

Estou sempre a tropeçar em mais um "projecto pessoal" - leia-se secreto, para chegar lá primeiro que os outros - ou em peças que são escritas para dois ou três críticos lerem. "Gostei imenso da tua peça, já era tempo de alguém publicar". Pobre leitor das revistas da especialidade, tantas vezes angustiado a ler aquilo tudo como se fosse sério e fundamental para o seu aperfeiçoamento enófilo!

Na prova dos cultos, as pessoas disseram disparates, como toda a gente diz. Riram e gozaram o programa como toda a gente gosta de gozar. E, mais importante que tudo, enganaram-se. As pontes de contacto com os leitores estão aqui e é este o filão a explorar, para quem quiser ser lido e respeitado por TODOS, produtores, negociantes e público em geral.

Agora temos mais uma revista de vinhos em Portugal que, felizmente, parece estar aí para ficar. É muito bonita, chama-se Blue Wine e está a fazer um trabalho sustentado. Na sua carta de princípios, ou estatuto editorial, podia ler-se, no início do projecto, que se pretendia uma colagem ao comum leitor, para que ele se identificasse com a revista. Isto era dito em clara oposição à Revista de Vinhos que, no dizer do seu staff, "é feita só para o sector". Tudo bem. Eu esperei alguns meses. Até agora.

É que já complicaram tudo. Já querem afirmar que têm o melhor painel de prova e que só eles é que sabem provar. Que diabo os terá tentado, para cairem em tamanho abismo?

Só provam em condições xpto, nunca há provas de vinhos, por exemplo em casa de produtores, em restaurantes, ou salas de provas que não sejam as suas!

Os homens que tinham a chave da comunicação com o pobre leitor, já estão num campeonato de que ninguém quer ouvir falar. Prova cega? Boa! E o que tenho eu a ver com isso? Diga lá mas é se este vinho vale ou não vale o dinheiro que pedem por ele. Diga lá mas é quais são os best-sellers dos vinhos portugueses. Diga lá mas é quais são os restaurantes que mais roubam os clientes e quais os que mais os respeitam, no que toca à carta de vinhos!

Ninguém, mas mesmo ninguém, está empenhado em dar resposta a estas questões e outras cem mais.

É de ir às lágrimas.

Ou de deixar passar.

2006/07/29

Douro 2004: What should we expect?
Quinta de La Rosa's Centenary staged a massive tasting of the new 2004 Douros

Since the awful vintage of 2002, a kind of every-winemaker's-nightmare year, Gods have been merciful and generous for Douro producers. 2003 produced thick, tannic and yummy wines, with some excellent Reservas coming out. In 2004, wines show what they've been missing since 1999: balance and elegance. The tasting took place at The Vintage House Hotel, organised by the greatest wine PR of all times, Dorli Muhr. Which means, of course, that tasting conditions were second to none, and that the wines represented were an actual and effective way of feeling what "The New Douro" is all about.


I am not publishing my impressions in any magazine whatsoever, so I can be entirely informal. Or, even better, I can restrict my opinions to something like "I liked" and "I didn't like". Here it goes.

I liked

* "Prazo de Roriz" Red 2004 - Very good overall balance, the wood is well integrated and there is a freshness that floods both the nose and the mouth.
* "Três Bagos" White 2005 - More and more, you see who's actually behind the scene here. Dirk Niepoort now proposes a Rhein bottle. Follow the leader!
* "Xisto" Red 2004 - As I didn't like the previous - and first - edition of this wine, I have more than welcomed the 2004. Let's see what the Roquette-Cazes venture is preparing in the vintages to come. Because... Shouldn't this wine be a totally different one? Am I being naive?
** "Meandro" Red 2004 - The second wine of Vale Meão, it's very smooth, ripe and absolutely ready to drink.
**
"Post Scriptum" Red 2004 - I'm quite sure this will be one of the symbols of the 2004 vintage. Excellent balance of alcohol and acidity, with a carefuly-knit structure.
** "Três Bagos Sauvignon Blanc" White 2005 - Only 20% of this wine staged in oak barrels. Dry, fresh, and ready to drink. And, what's more, they came out with 14,000 bottles of this besutiful wine.
*** "Charme" Red 2004 - It's the first time that I find Charme a slot behind that of Batuta, but that only means that Batuta 2004 is a huge accomplishment. This Charme shows thickness and elegance in equal, massive, amounts.
*** "Quinta do Crasto Touriga Nacional" Red 2004 - Very good, probably the best showcase of the eponymous Touriga Nacional available, for the time being.
*** "Quinta de La Rosa" Reserva Red 2004 - La Rosa exorcised all its ghosts by hiring Jorge Moreira. Same grapes, same cellar, give rise to wines you would have never expected, ever since the 2002 vintage.
*** "Redoma" Red 2004 - The best Redoma yet, this is a shockingly good wine, nothing like any of the other 2004s from the Douro. Happy buyers of this wine will be surprised!
*** "Três Bagos" Red 2004 - This wine stands out from the whole collection of previous "Três Bagos". Now, it's a deep, complex wine, filled with balance and freshness. It surely will get its reputation back, as Lavradores de Feitoria's flagship product.

**** "Quinta do Vale Meão" Red 2004 - Incredible length and depth. This Vale Meão is a masterpiece, although I find that it is at least a year's distance of being ready to drink.
**** "Batuta" Red 2004 - Jam, pepper and the "usual" surprise of having a massively tannic wine in the mouth without any evidence of it whatsoever!
**** "Pintas" Red 2004 - Thick, long and spicy. What can I say, when this is a wine I wouldn't mind to have something against, given its skyrocketing career but, then again, I don't!
**** "Poeira" Red 2004 - Another monotonously fabulous wine, maybe at its peak. When he gets an elegant year, Jorge Moreira surely knows how to take advantage of it. Brilliant.
**** "Quinta do Vale Dona Maria" Red 2004 - The first vintage from this producer that I really enjoyed! It boasts 14,7º alcohol and yet you taste it as a super-elegant wine.

I didn't like


- "Altano" Reserva Red 2004 - A wine with no soul, for the soul-less drinker. What's the point of producing this kind of wines?
- "Callabriga" Red 2004 - What were they doing there with so poor a sampling of Sogrape's wines, in such a rich and revealing tasting?
- "Chryseia" Red 2004 - They say that the wine only staged for 9 months in Taransaud French oak barrels, meaning that it should not show so many "woody" notes. I'd say that if the wine would stay in oak barrels for a greater period of time, it would be less marked by the wood and would turn out to be more drinkable. As its is, it's a terrible experience. It will smooth down in the bottle, you might say. Of course. In 20 years time.


Sou Cavaleiro do Vinho do Porto
Em pleno dia de S. João, no passado dia 24 de Junho de 2006, fui entronizado Cavaleiro Confrade Honorário da Confraria do Vinho do Porto. Pela mão de Francisco (Vito) Olazábal, Chanceler da confraria, recebi as insígnias relativas ao grau, ao mesmo tempo que ouvia, ditas por ele, as palavras: "foi a sua paixão pelo Vintage que o trouxe até aqui; espero que continue!"
Anteriormente, enquanto caminhava ainda sobre a passadeira encarnada, antes de me serem dados a tomboladeira e o diploma, anunciavam, ao microfone, que "Fernando Melo" é jornalista da Revista de Vinhos e tem particular interesse pelo Vinho do Porto, especialmente Vintage". Com a enorme dificuldade que eu próprio tenho em interpretar ou sequer descrever a minha própria vida, tive ali, de repente, um dos atravessamentos mais correctos e de maior alcance dela.
Estava plenamente convencido de que não ia escrever nada sobre este assunto da minha entronização. Tanto, quanto agora estou de que o devo fazer. É que são inumeráveis - felizmente - todos aqueles que me têm ajudado, ao longo de mais de dez anos, numa caminhada tão complexa quanto fantástica, de mergulho nas coisas do vinho. É a eles todos - a vocês todos - que quero dedicar a glória que me foi concedida.
Muito obrigado.

São Sabicos, Senhor, e são Sábios
Joaquim Madeira e sua mulher Graça, uma paixão que se prova

No dia 29 de Junho de 2006, quando fora do microclima do interior do meu confortável carrinho o mundo fundia a 40ºC, aterrei em Aldeias de Montoito, ali para os lados de Reguengos, para um programa muito especial. Realizava ali o casal o seu "Almoço das Ervas 2". Falhei o primeiro, por um erro óbvio de avaliação de prioridades - que me fez ficar em Lisboa por coisa nenhuma, há cerca de um ano e meio - e este ano não permiti que isso acontecesse. Até porque andava "por ali", entre Monsaraz e a Vidigueira, há dois dias.
O intuito do acontecimento era, segundo a pequena mas bonita acta lavrada no livrinho que Graça e Joaquim fizeram o favor de elaborar, "partilhar alguns sabores e aromas alentejanos, perdidos no tempo (...), que assiduamente eram parte constitutiva dos pratos dos nossos antepassados e que emanaram de espécies herbáceas e arbustivas, muitas delas ainda existentes nos campos do Alentejo". De todas as ervas presentes, tiveram parte nobre as beldroegas e os cardos. São as mais "pobres" e as mais "espontâneas", apesar de darem nas mais fabulosas sopas e fundos que Portugal tem. Hoje são espezinhadas e passam despercebidas, outrora eram o ouro da terra e a garantia, para os pobre mesmo pobres do Alentejo, de que o sono nocturno correria seguido e profundo, até à labuta do dia seguinte. Graça e Joaquim são casados, mas corre neles o mesmo sangue, alentejano, que é o dos Sabicos e cuja casa mãe é aquela que hoje ocupam e na qual produzem vinho: A Casa de Sabicos. Se no Alentejo são todos primos, aqueles são uns primos muito especiais, porque o seu amor dá proporcionar momentos e dias inesquecíveis. Atenção, porém, às palavras de Graça Santana Ramalho: "As ervas não são o fim, o fim é o convívio convosco; temos conhecido muitas pessoas boas".

A Dança das Ervas

Foi assim que Joaquim e Graça entenderam chamar ao repasto, que começou mais de uma hora atrasado, por minha causa, que ainda não consigo medir a lonjura das distâncias. O baile herbáceo tinha, na verdade 6 danças diferentes e só chegou ao fim quem conseguiu ter o metabolismo em bom estado logo no início. Foi o meu caso, devo dizer, apesar de ter ficado a conversar com as iguarias e com os vinhos até ao dia seguinte. Foram, então as seguintes: 1) "Ervas em Fruta": Meloa com tomilho; Maçã reineta com poejo; Morangos com hortelã. 2) "Ervas em Legumes": Abóbora com coentros; Favinhas com entrecosto, coentros, hortelã e folhas de alho; Saladas de alface e tomate com agrião, coentros, hortelã e orégãos; 3) "Ervas em Ervas": Acelgas com feijão; Cardinhos com carnes de porco alentejano; Beldroegas com queijo e ovos. 4) "Ervas em Tudo e Tudo com Muitas Ervas": Queijo assado com orégãos, tomilho, alecrim e compota de frutos silvestres; Sopa de tomate com hortelã da ribeira, orégãos, bacalhau e ovos; Borrego estufado com rosmaninho. 5) "Ervas em Licor": Licor de poejo. 6) Dieta (!!!): Sopa de feijão com massa e batatas; Arroz de hortelã com bacalhau; Migas de espargos com enchidos fritos de porco alentejano; Gelado de limão; Gelado de meloa; Pastéis de toucinho.
O projecto "Sabicos" parece de monta, mas a boa companhia e o ar condicionado do telheiro que o casal mandou fechar tornaram tudo mais fácil.
Estava tudo num ponto incrivelmente bom, sendo a escolha dos "melhores" apenas determinada pelo gosto de cada um. A mim, "bateram" com força a sopa de tomate - parabéns, Graça, porque não me levou ao tapete" -, as beldroegas com queijo e ovos, leia-se sopa de beldroegas - A MELHOR SOPA DO MUNDO -, os cardinhos com carnes de porco alentejano e a sopa de feijão com massa e batatas, cuja confecção, do mais cândido que há, derruba qualquer um. Diziam os habitués que é normal ficar-se com a fantasia de provar de novo a iguaria quando se pensa em sabicar outra vez...

Os vinhos

Joaquim Madeira é o actual presidente da Comissão Vitivinícola Regional Alentejana e, se isso não vem para o caso, verdade é que instituir-se em produtor de vinhos de qualidade significa, pelo menos, obrigação de não falhar. O que o próprio, aliás, reconheceu, com outras palavras. Quem o colocou nas coisas do vinho foi o seu pai que, em 1965, quando apanhou o seu filho recém licenciado, o pôs a produzir um vinho. "Tinha 14 castas, o que hoje seria impensável". Pois, não fora o sabico Madeira ter-se acometido à mesma tarefa em 2004, ao juntar num mesmo vinho - o Joaquim Madeira tinto 2004 (17) - 14 uvas diferentes. O resultado foi um néctar que, do alto dos seus 15º, publica impressões de antigamente como poucos vinhos hoje fazem. Há alguma passa presente no seio da selva frutada que envolve o copo, mas os toques balsâmicos e a boca cheia de coisas aveludadas conquistam-nos com violência e sem piedade. Ainda anteontem tive uma conversa com amigos ao jantar, em que eu confessava a minha prisão emocional aos vinhos velhos e aos vinhos que me trazem as sensações clássicas. O enólogo que hoje assina a carta de compromisso nos Sabicos é Paulo Laureano e, como não podia deixar de ser, há um Joaquim Madeira branco 2005 (16). É um Antão Vaz, a casta em que Laureano tem muitos pergaminhos e é um branco que satisfaz bem a procura de coisas boas. Adivinha-se-lhe mais comprimento, que se vai buscar ao passar do tempo em garrafa. Tropical, bem maduro, até parecia ter algum açúcar residual, "mas não", disse o Paulo: "tem menos de 3 g/l de açúcar". Sim, senhor enólogo!
A culminar, saiu um produto novo para as mesas, o "Avó Sabica tinto 2004". Ao mesmo tempo que é uma homenagem a Maria, avó de ambos - Graça e Joaquim - é um vinho cujas uvas provêm da vinha "de pedra" no Redondo que o casal detém. Pareceu-me que podia estar ali em gestação um novo estilo de vinho alentejano, mas era cedo para opiniões definitivas. Está para sair e então logo o provaremos. Fica, no entanto, o aviso.

2006/03/08

Abençoadas bolhinhas
O Champagne Deutz aposta forte em Portugal

Miguel Grijó e Pedro Leitão, da Vinidecanter, já tinham avisado que estavam a "trabalhar" com a Deutz (lê-se Datze, com o A mudo), mas eu estava longe de imaginar que o trabalho cavaria tão fundo no mercado nacional, com honras de jantar na Galeria Gemelli, em Lisboa, com o representante da família que até há bem pouco - antes da compra pela Louis Roederer - da casa Deutz, perto de Epernay, para explicar tudo aos menos letrados em bolhinhas na forma de cordão, como é o meu caso. A lição valeu a pena, na que foi uma organização conjunta Loja Corpo e Alma / Vinidecanter.

A Deutz foi fundada em 1838 por dois franceses com nomes pouco óbvios em França, não estivéramos na região de Champagne, onde os sangues tendem a fundir-se mesmo a baixas temperaturas: William Deutz e Pierre-Hubert Geldermann, ambos fugidos da Prússia de Napoleão, mas conhecedores do seu métier. Geldermann era vendedor de champanhes e Deutz era homem de negócios. A amizade entre os dois sócios era tal que os seus filhos Alfred Geldermann e Marie Deutz - adivinhe quem era filho de quem - casaram. A coisa fica séria e a Deutz acaba por fazer parte do núcleo exlusivo de fundadores do Syndicat des Grandes Marques, em 1882. Foi então que passou a fazer parte da classe das grandes marcas de Champagne, uma designação que, se for tudo sempre bem feito, não se perde mais. Estava-se, portanto no "segundo império" napoleónico, trinta anos antes dos gigantescos problemas que quase destruiriam toda a Champagne, ou toda a França.

A célebre revolução dos lavradores da primeira década do séc. XX resultou em saques e apropriações ilegais de enorme gravidade, mal do qual de resto França só se veria livre 50 anos mais tarde, passadas as guerras mundiais e a fome, que dizimaram as populações rurais. No que toca à Deutz, apesar de sempre se ter conseguido manter acima da linha de água, a obsessão pela produção e respeito pelos antepassados - o carisma dos fundadores ainda hoje se sente, apesar de estar nas mãos da Roederer - quase roçou a loucura, com a família totalmente endividade e tecnicamente falida e ainda assim sendo sempre a fazer o esforço para continuar. Há qualquer coisa nas bolhinhas que mais parece magia do que vinho.

Hoje a empresa está bem e recomenda-se. Vinhedos próprios que satisfazem cerca de 40% das carências vitícolas da casa, vindo as restantes uvas de lavradores com quem a Deutz mantém relações estáveis há várias gerações, sem nunca as haver interrompido, apesar das guerras e revoluções. A produção actual situa-se em 1,4 milhões de garrafas. Dessas, provámos algumas na Galeria Gemelli, num jantar que mostra bem os pergaminhos do Chef Augusto Gemelli quanto a capacidade de conjugação vinhos/iguarias.

O jantar

Pecados de queijo Scamorza fumado e alcachofras, gelatina de pêssego e alecrim.
85 Deutz Brut Classic N/V (30 Euros)
Conjugação: 50%. Tipo tabuleiro de xadrez, à maneira de contraste, talvez duros demais. Tenho um preconceito severo em relação à amizade entre alcachofras e vinhos... Em relação ao champagne, tendo em quanto que se trata de um vinho entrada de gama, já estamos muito bem.

Ostras ao vapor com couve lombarda crocante e emulsão de trufa branca.
92 Deutz Millésimé 1999 (30 Euros)
Conjugação: 90%. Seria impossível imaginar o resultado sem o provar, porque a elaboração estava brilhante. Até a trufa branca casou bem com o néctar. Ostras com couve? Há que provar! Conselho: não tente fazer em casa.

Gnochetti de camarão sobre caril de fruta branca, presunto estaladiço.
95 Deutz Blanc de Blancs 1998 (55 Euros)
Conjugação: 80%. O caril parece saltar do prato, quando se leva o vinho à boca. Há um efeito potenciador de parte a parte que torna tudo muito feliz. O vinho é, como o nome diz, feito a partir apenas de castas brancas e apresentou uma frescura e comprimento na boca invulgares na sua tipologia.

Suprema de pintada cozinhada a baixa temperatura, redução agridoce de citrinos e pudim de risotto de shiitake.
92 Deutz Cuvée William Deutz 1996 (100 Euros)
Conjugação: 75%. Algo confuso no palato, este caso foi paradigmático para mim, talvez pelas notas oxidativas do champagne. Gostava imenso de acompanhar o entusiasmo dos promotores em relação aos produtos topo de gama, como é este champagne de homenagem a um dos fundadores, mas infelizmente muitas vezes acontece o contrário. Talvez ele tivesse brilhado mais se o prato fosse menos eclético.

Sopa morna de chocolate branco com especiarias, frutos silvestres e perfume de laranja.
89 Deutz Cuvée Rosé 2000 (50 Euros)
Conjugação: 50%. As notas deste rosé inspiram mais frutos secos e hortelã do que os frutos silvestres e, por isso mesmo, a sensação foi mais a de ter duas coisas separadas, vinho e iguaria, do que os dois num só.

As inefáveis conjugações musicais de Tiago Sallas, da Corpo e Alma, sairam quase imperceptíveis, por duas razões, que são as de sempre: 1) Música excessivamente baixa; 2) Ruído excessivamente alto. Mas a sua insistência há-de dar um dia um tratado de triangulações vinho-música-iguaria.

2006/02/24

Vinhos novos a abrir e - espera-se - a marcar o ano

Ficam aqui as notas de prova - pela ordem por que foram obtidas - de novidades que chegaram entre a quadra natalícia de 2005 e as primeiras semanas de 2006. Vamos tentar ser sistemáticos e provar todas as segundas-feiras.

14,5 Ribeira da Ervideira "Castas d’Ervideira Touriga Nacional" Vinho Regional Alentejano tinto 2003
Boa frescura. Demora algum tempo a mostrar tipicidade. Final de boca em cacau e chocolate amargo. Notas vegetais em toda a prova. Mesmo tendo relativamente pouco álcool (13º), consegue mostrar um perfil alcoólico.

13 Ribeira da Ervideira "Terras d’Ervideira" Vinho Regional Alentejano tinto 2004
Vinho directo, sem grandes nuances nem ambições. Temos um verdadeiro alentejano, com pouca acidez. Taninos evidentes, mas dá uma prova harmoniosa.

15 Ribeira da Ervideira "Vinha d’Ervideira" DOC Alentejo Colheita Seleccionada tinto 2004
Bom fruto no nariz, vibrante. Entrada de boca elegante, para depois abrir em fruto maduro e bom comprimento. Termina seco, com toques da madeira, o que lhe faz adivinhar mais um ou dois anos de pleno rendimento aromático em garrafa.

17 Ribeira da Ervideira "Conde d’Ervideira" DOC Alentejo Garrafeira tinto 2002
Nariz muito floral e frutado; chega a ser carnudo. Muito bom equilíbrio na entrada e desenvolvimento de boca, a povoar o palato em quase toda a parte. Excelente complexidade, explosão de aromas e sensações na boca e no arrière-goût.

15 Ribeira da Ervideira "Conde d’Ervideira" DOC Alentejo Reserva tinto 2003
Notas balsâmicas no nariz, complementadas por retronasais que inspiram a madeira e o estágio em barrica. Mostra ameixa madura na boca, até ao final. Tem muito por onde evoluir, para assentar a matéria prima que contém e ganhar complexidade. Este vinho faz uma passagem interessante do estilo tradicional para o moderno.

13 S.A.A. Mascata "Quinta do Côro" Vinho Regional Ribatejano Reserva tinto 2003
Alguns acetaldeídos no nariz. Também não está à altura da promessa da entrada de boca. Desenvolve facilmente terciários desagradáveis, que tornam o vinho quase rústico.

16 Manuel J. Pinto "Casa da Palmeira" DOC Douro tinto 2001
Belíssima frescura, este vinho perdeu as notas de madeira americana exageradas que outrora mostrava e afinou na garrafa. Está pronto para ser bebido. Foco frutado muito bom, com boas nuances de ervas aromáticas, dando uma prova agradável.

15,5 Manuel J. Pinto "Quinta de Vila Maior Touriga Franca" DOC Douro tinto 2002
100% típico da casta e, nesse sentido, um bom exemplar de Touriga Franca, A "Touriga Francesa" de há pouco tempo. Bem integrado, com a presença da madeira ainda a fazer-se sentir. Pergunto-me, no entanto, se faz falta este monovarietal no mercado.

17,5 Manuel J. Pinto "Quinta de Vila Maior Touriga Nacional" DOC Douro tinto 2002
(Madeira Cadus?) Força e elegância, neste exemplar da rainha das castas portuguesas. Adivinha-se-lhe o perfil majestático quando se leva o copo ao nariz e faz-se uma vénia a este fantástico vinho quando se põe na boca. Descobre-se um lado mineral quando deixa o palato e entra-se num percurso comprido de estímulos, quando se permite que seja o vinho a invadir-nos e não o contrário.

17 Manuel J. Pinto "Quinta de Vila Maior" DOC Douro tinto 2002
Sangue fresco e uma miríade de aromas, em torno da esteva e das violetas, num fundo mineral que é difícil de esquecer. A boca podia corresponder melhor a estes excelentes augúrios aromáticos, mas fica aquém. Pelo final seco de prova, contudo, pode ser que as coisas afinem e melhorem, com o passar do tempo.

17,5 Churchill Graham "Churchill Estates" DOC Douro tinto 2003
Muito floral no nariz, mostrando predominância de Touriga Nacional. Boa frescura, a corresponder ao grande ano que foi 2003 para os produtores de vinho de mesa duriense. Bom comprimento na boca e final longo.

16 Quinta Nova N. S. Carmo "Quinta Nova de N. S. Carmo" DOC Douro Reserva tinto 2003
Aromas de uva pisada em lagar que se tornam numa nota dominante. Fruta passa, algo enjoativa. A boca é mais interessante que o nariz, mas o conjunto não está nada afinado. Ou faz a afinação que lhe falta, ou estamos a perder tempo.

16,5 Soc. Agr. Quinta da Alempassa "Quinta da Alempassa" DOC Douro Reserva tinto 2004
Aromas complexos e maduros, a denunciar um terroir quente. Entrada de boca é feita em equilíbrio, para depois abrir cereja, compota de ginjas e alguma esteva. As notas sobremaduras dominam, contudo, o conjunto. Vai encontrar, seguramente, muitos adeptos este vinho estreante.